Para as jovens Rohingya que vivem no campo de Kutupalong, em Cox’s Bazar, aprender uma competência que lhes permita ajudar a sustentar as suas famílias abre novas perspetivas.
Até há pouco tempo, Samuda Khatum não sabia o que fazer se as luzes solares no seu abrigo no campo de refugiados de Kutupalong deixassem de funcionar. Ou como consertar a sua ventoinha caso ficasse sem energia.
"Quando os nossos maridos saem para trabalhar e temos problemas com as luzes e a energia solar, temos de esperar e ficar na escuridão", disse ela.
Hoje, a jovem de 19 anos usa um capacete de segurança sobre o seu lenço de cabeça cor-de-rosa e manuseia uma chave de fendas para instalar um interruptor numa parede. Ela e um grupo de outros jovens refugiados Rohingya, cerca de metade deles mulheres, estão a aprender a instalar e a fazer a manutenção de sistemas solares. Este é um dos 10 cursos de formação profissional aprovados pelo governo e oferecidos aos jovens nos campos de Cox’s Bazar pelo ACNUR, a Agência da ONU para os Refugiados. Outros cursos incluem canalização, operação de máquinas de costura, trabalho comunitário na área da saúde e agricultura.
Após vários meses de formação, num total de 360 horas, os refugiados podem obter uma qualificação reconhecida, que lhes permite candidatar-se a funções de voluntariado qualificado nos campos. Esta certificação também é reconhecida em Myanmar, onde muitos esperam regressar um dia.
"Sinto-me bem por saber que, se a energia solar não funcionar, posso consertá-la eu mesma", disse Samuda. "Podemos usar isto para conseguir um trabalho dentro dos campos e ajudar as nossas famílias."
Criar oportunidades
Desde 2022, cerca de 8.000 jovens que vivem nos campos de Cox’s Bazar participaram nestas formações, que estão entre as poucas oportunidades de crescimento disponíveis para a juventude nestes campos sobrelotados, onde vivem cerca de 1 milhão de refugiados Rohingya.
"Estamos a direcionar-nos para os jovens porque eles não têm muitas oportunidades", explicou Partha Protim Mazumder, da equipa de meios de subsistência do ACNUR em Cox’s Bazar. "Sem um envolvimento significativo, têm pouco com que se ocupar, o que pode levar à frustração e a outros desafios."
Mulheres refugiadas Rohingya durante uma sessão de formação sobre instalação e manutenção de sistemas solares. Outros cursos incluem canalização, operação de máquinas de costura, trabalho comunitário na área da saúde e agricultura. © ACNUR/Shari Nijman
Sinto-me bem por saber que, se a energia solar não funcionar, posso consertá-la eu mesma.
Samuda Khatum
A falta de perspetivas nos campos tem contribuído para o aumento da violência e da criminalidade nos últimos anos. A insegurança representa uma ameaça particular para as jovens mulheres, que já passam grande parte do tempo confinadas aos seus abrigos devido à cultura conservadora da comunidade. A formação pode abrir-lhes novos horizontes.
"É um espaço seguro onde podem conhecer outras raparigas como elas e partilhar os desafios que enfrentam", disse Mazumder. "Muitas mulheres, após concluírem o curso de formação, estão a trabalhar nas suas comunidades, incluindo na reparação de luzes solares para os seus vizinhos."
Cortes na ajuda ameaçam o progresso
Desde que o campo de Kutupalong foi estabelecido em 2017, quando mais de 750.000 Rohingya fugiram para o Bangladesh para escapar a uma onda de violência e discriminação no estado de Rakhine, no oeste de Myanmar, os refugiados que ali vivem têm dependido amplamente da ajuda humanitária. Oito anos depois, essa assistência começou a escassear, e os progressos alcançados na melhoria das condições de vida, na preparação do campo para resistir a condições climáticas extremas e na promoção da autossuficiência dos refugiados estão agora em risco.
Durante uma visita a Kutupalong no fim de semana, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, visitou um centro de formação profissional e sublinhou a necessidade de criar mais oportunidades como estas.
O Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, conversa com jovens refugiados num centro de formação profissional no campo de Kutupalong. © ACNUR/Shari Nijman
"Os recentes cortes nos recursos de ajuda por parte dos doadores tornaram todo este trabalho muito mais difícil", afirmou Grandi. "Acabei de conhecer jovens refugiados que estão a tentar adquirir competências e a obter educação. Se a assistência internacional diminuir, será verdadeiramente trágico, especialmente para os centenas de milhares de jovens que vivem neste local tão desafiante, sem perspetivas para o futuro."
À medida que mais refugiados continuam a chegar aos campos, fugindo da violência e da insegurança persistentes em Myanmar, Grandi apelou a um reforço dos esforços para promover a paz e criar condições para que os Rohingya possam regressar com segurança e de forma voluntária ao seu país de origem. Entretanto, pediu aos doadores que não esqueçam os refugiados Rohingya, nem as comunidades no Bangladesh que os acolheram e partilharam os seus escassos recursos ao longo dos últimos oito anos.
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