Yaselly Martínez Ortiz, criada na Colômbia, trabalha agora para ajudar as comunidades colombianas afetadas pelo conflito armado do país.
Assim que Yasselly Martínez Ortiz aceitou o seu cargo de funcionária pública na remota região de Chocó, na Colômbia, foi feita uma apólice de seguro de vida em seu nome.
Yasselly trabalha como a chamada "personera", uma espécie de provedora municipal encarregada de garantir o respeito pelos direitos humanos dos residentes. Uma indicação do risco do seu trabalho é o facto de Yasselly dizer que, tanto quanto sabe, os "personeros" são os únicos funcionários públicos na Colômbia que recebem automaticamente um seguro de vida.
"Somos a voz das comunidades que não têm voz", diz ela, acrescentando que este papel de defensora pública a tornou regularmente num alvo. "Pessoalmente, já recebi ameaças por fazer o tipo de trabalho que fazemos... [e] sei que cerca de 80 por cento dos meus colegas também já foram ameaçados."
Mesmo entre este grupo de alto risco, a posição de Yasselly é particularmente precária: a advogada de 31 anos está sediada em Bellavista, uma pequena cidade que foi fundada na sequência do massacre de 2002 na aldeia vizinha de Bojayá, que deixou 79 pessoas mortas e se tornou um dos acontecimentos mais emblemáticos do conflito armado que dura há 58 anos na Colômbia.
A Comissão da Verdade do país estimou recentemente em cerca de 450.000 o número de mortos no conflito interno entre guerrilheiros, militares colombianos e grupos paramilitares. Embora o governo tenha assinado um acordo de paz com o principal grupo guerrilheiro, as FARC, em 2016, o conflito entre outros grupos guerrilheiros e fações paramilitares continua em Chocó - uma região de selva escassamente povoada na costa ocidental do Pacífico da Colômbia - e não só.
A violência contínua significa que Yasselly é regularmente chamada a lidar com situações tão devastadoras como o "confinamento", uma prática generalizada em que grupos armados encerram aldeias inteiras, avisando os residentes para não saírem dos limites da sua povoação, sob pena de morte ou outras retaliações, incluindo violência sexual.
Os habitantes de Chocó são, na sua esmagadora maioria, de origem indígena ou afro-colombiana e, durante séculos, viveram da terra, pescando nos rios próximos e cultivando o rico solo tropical. A prática do confinamento destrói os seus modos de vida tradicionais, privando as pessoas de direitos básicos como o acesso aos cuidados de saúde, à educação e até à alimentação durante semanas, meses ou mesmo anos a fio, o que resulta em fome e desespero generalizados.
Uma dessas comunidades é a Reserva Indígena Embera Dovida, uma aldeia com cerca de 150 pessoas, situada nas margens do rio Atrato. A vida deles já foi "tranquila", diz o "gobernador" ou chefe da aldeia, Darío Mecha*.
"Antes, pescávamos na cascata e trabalhávamos nos campos", recorda. Mas depois, por volta de 2004, apareceram grupos armados. "Começaram a dizer que já não podíamos ir a pé para os campos, que já não podíamos trabalhar e também nos disseram que não podíamos trazer muita comida" da cidade, nas canoas motorizadas que são o principal meio de transporte da região.
"Por isso, agora só ficamos aqui", disse, apontando para o pequeno grupo de casas de colmo, empoleiradas em estacas. O confinamento conduziu não só a problemas nutricionais, mas também a um aumento das tensões na comunidade, uma vez que os pais lutam para lidar com crianças esfomeadas e aborrecidas e as mulheres vivem aterrorizadas com o espetro omnipresente da violência sexual, caso se afastem demasiado da aldeia.
"Aguentam o máximo de tempo possível", diz Yasselly, "mas quando começam a ver confrontos dentro das aldeias, ou quando sentem que estão em risco iminente de serem mortas, ou quando um membro [da comunidade] é morto, vêem-se obrigadas a fugir".
Com uma estimativa de 6,8 milhões de colombianos deslocados dentro das fronteiras do seu próprio país, a Colômbia tem a segunda maior população de deslocados internos do mundo, a seguir à Síria.
Com demasiada frequência, aldeias inteiras em Chocó acabam por fugir para a maior cidade da região, Quibdó, onde, privados dos seus meios de subsistência, lutam para sobreviver e manter um teto sobre as suas cabeças. Numa reviravolta cruel do destino, estas pessoas deslocadas internamente são por vezes relegadas para bairros marginalizados que estão também sob o controlo de grupos armados.
Yasselly trabalha para aliviar o sofrimento do confinamento, assegurando, por exemplo, que os professores possam aceder às comunidades confinadas e evitar a perda de vidas ou de membros, denunciando as minas terrestres - que são frequentemente colocadas pelos grupos armados - às autoridades responsáveis pela sua remoção. O ACNUR está a ajudar Yasselly e outros "personeros" a fazer o seu trabalho, doando-lhes o equipamento de que necessitam para desempenhar as suas funções, bem como a tão necessária ajuda às comunidades que servem.
Para além de apoiar os "personeros", o ACNUR trabalha com as autoridades nacionais e locais para monitorizar as situações de confinamento e para prevenir a deslocação. O ACNUR também ajuda a fortalecer as organizações indígenas e afro-colombianas de base comunitária através da construção de infraestruturas, de formações, e da criação de ambientes seguros para crianças e adolescentes.
Embora a longevidade e o alcance do conflito em Chocó signifiquem que as necessidades dos habitantes ultrapassam em muito a capacidade de resposta de Yasselly, ela diz que sente uma grande satisfação por cada ato de violência que consegue resolver ou, ocasionalmente, até mesmo evitar.
"Não vamos resolver o problema porque são problemas estruturais, mas fazemos a nossa parte para que as comunidades que se encontram nestas situações recebam ajuda atempada e, no meio de tantas dificuldades, tenham alguma esperança", disse Yasselly, natural de Quibdó, cuja família, como tantas outras famílias colombianas em Chocó e não só, também foi vítima de deslocação forçada.
Yasselly diz que, apesar dos perigos do seu trabalho, tanto a sua família como a sua comunidade mais alargada são uma fonte de motivação. Tendo visto os efeitos da deslocação interna propagarem-se, de forma devastadora, ao longo dos anos e das gerações, ela sabe em primeira mão como é crucial continuar a defender as comunidades sem voz de Chocó.
"Se aqueles de nós que estão a fazer este trabalho de defesa dos direitos humanos não o fizerem", pergunta ela, "como é que as comunidades vão sobreviver?"
*Nome alterado por razões de proteção
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