Jovens refugiados defendem ação climática no campo de Tongogara, no Zimbabué Jovens refugiados defendem ação climática no campo de Tongogara, no Zimbabué
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Jovens refugiados defendem ação climática no campo de Tongogara, no Zimbabué

Três jovens refugiados estão a liderar os esforços para restaurar o seu ambiente e a inspirar outros a juntarem-se a eles no combate às alterações climá...

5 de janeiro, 2024

Tempo de leitura: 6 minutos

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Três jovens refugiados estão a liderar os esforços para restaurar o seu ambiente e a inspirar outros a juntarem-se a eles no combate às alterações climáticas.

Jeanne Muhimundu recorda vivamente o dia em que o ciclone Idai atingiu o campo de refugiados de Tongogara, em março de 2019. A refugiada do Ruanda, agora com 21 anos, estava em casa com os pais e os cinco irmãos quando ventos fortes e chuvas torrenciais atingiram a área.

"A nossa casa ficou seriamente danificada", conta ela. "Muitas pessoas ficaram sem casa nas comunidades de refugiados e locais. O nosso gado também morreu".

Embora menos graves, os ciclones Charlene, em 2021, e Ana, em 2022, também afetaram o campo. Tongogara está regularmente e cada vez mais exposto a ciclones, chuvas fortes e temperaturas escaldantes. O rio Sabi, nas proximidades, inunda-se regularmente, obrigando os refugiados a fugir dos seus abrigos e, no verão, as temperaturas atingem frequentemente os 45°C. Na região da África Austral, outros campos de refugiados e de pessoas deslocadas internamente em Angola, na República Democrática do Congo (RDC), no Malawi, em Moçambique e na Zâmbia são igualmente vulneráveis ao clima.

"Todas estas catástrofes fizeram-me perceber como as pessoas podem perder os seus meios de subsistência, as suas casas; como as suas vidas podem mudar num minuto. O que vivi e testemunhei no campo fez-me querer agir", diz Jeanne, explicando a sua decisão de se juntar à Coligação de Refugiados para a Ação Climática (RCCA), um grupo criado por jovens ativistas refugiados em abril de 2020 para sensibilizar os residentes do campo para os impactos das alterações climáticas e para a necessidade de preservar o seu ambiente.

Jeanne Muhimundu (à direita) planta uma mangueira com crianças no campo de refugiados de Tongogara.

Jeanne Muhimundu (à direita) planta uma mangueira com crianças no campo de refugiados de Tongogara. © UNHCR/Hélène Caux

Duas mil árvores plantadas

O campo de Tongogara foi criado em 1984 para acolher refugiados moçambicanos que fugiam da guerra civil no seu país. Atualmente, alberga cerca de 16.000 refugiados, principalmente do Burundi, Moçambique e Ruanda. À medida que novas vagas de refugiados procuraram segurança em Tongogara nas últimas duas décadas, muitas árvores foram cortadas para lenha, para construir abrigos e produzir carvão para uso pessoal e para gerar rendimentos.

"Quando eu e a minha família chegámos da RDC (República Democrática do Congo) em 2010, havia árvores por todo o lado", recorda Elie Tshikuna, outro jovem ativista do clima e membro fundador da RCCA. "À medida que o campo foi crescendo com mais refugiados, mais árvores foram cortadas. Eu costumava encontrar sombra debaixo das árvores no caminho para a escola quando estava calor. Isso já não existe. Agora, as árvores estão sobretudo nos limites do campo".

Tal como Jeanne, Elie, 23 anos, está empenhado em tornar a Terra num lugar melhor. Ele e outros membros da RCCA mobilizam regularmente 30 a 50 jovens refugiados para a plantação de árvores.

Elie Tshikuma é um dos membros mais ativos da Coligação de Refugiados para a Ação Climática (RCCA).

Elie Tshikuma é um dos membros mais ativos da Coligação de Refugiados para a Ação Climática (RCCA). © UNHCR/Hélène Caux

"É assim que a Terra se cura", explica. "Ao plantar árvores, estamos a enviar uma mensagem direta aos líderes mundiais de que queremos menos monóxido de carbono e substâncias relacionadas com o carbono na atmosfera. Esta é também uma forma de promover a responsabilidade nas crianças e nos jovens, uma vez que eles crescem sabendo que, por cada árvore cortada, tem de ser substituída."

Para além de proporcionarem sombra no verão, as árvores atuam como quebra-ventos durante as tempestades e evitam a erosão do solo. Desde 2020, a RCCA plantou cerca de 2.000 árvores em Tongogara e arredores, incluindo árvores de fruto como mangueiras, macadâmias, papaias, limoeiros e laranjeiras, que trazem benefícios adicionais para a comunidade.

Mudar mentalidades

Quando começaram a sua ação de sensibilização em Tongogara, os membros da RCCA enfrentaram a resistência de outros refugiados. As alterações climáticas e as questões ambientais eram desconhecidas e não eram consideradas prioritárias. "Penso que fizemos um excelente trabalho de mudança de mentalidade", afirma Elie com orgulho. "Interagimos com mais de 2.000 crianças e jovens através de campanhas de sensibilização. Dedicámos tempo a explicar-lhes que as alterações climáticas são uma crise global e que a sua ação em Tongogara faz parte da resposta global."

O ACNUR e os seus parceiros em Tongogara estão a contribuir para os esforços dos refugiados no sentido de tornar o campo um lugar mais verde. "Estamos a tentar promover fontes alternativas de energia, como a utilização de resíduos animais ou vegetais", diz Yuhei Honda do ACNUR em Tongogara. "Temos esperança de que este tipo de alternativas venha a ganhar força."

O ACNUR também instalou sistemas solares para alimentar cinco furos de água no campo, em vez dos habituais geradores a gasóleo.

As campanhas de limpeza são outra atividade importante organizada pela RCCA. Todas as primeiras sextas-feiras do mês, dezenas de jovens refugiados armados com luvas, vassouras e caixotes do lixo espalham-se pelo campo, recolhendo lixo como latas de refrigerante vazias, garrafas de plástico, sacos de plástico e restos de carvão.

"Tudo abandonado por pessoas que claramente não fazem ideia do impacto negativo que geram no ambiente", comenta Gawaar Juich, um refugiado sul-sudanês de 27 anos cuja casa ficou completamente destruída quando o ciclone Idai atingiu Tongogara. "É um longo processo para educar as pessoas, especialmente as gerações mais velhas que têm o hábito enraizado de deitar o lixo em qualquer lado. Esperamos conseguir, lenta mas seguramente, convencê-las a adotar métodos mais ecológicos de eliminação do lixo".

Jeanne (ao centro) a caminho com outros membros da RCCA para apanhar lixo no campo

Jeanne (ao centro) a caminho com outros membros da RCCA para apanhar lixo no campo. © UNHCR/Hélène Caux

O facto de as crianças e os jovens participarem nestas campanhas é um grande êxito para Gawaar e os seus colegas. As crianças disseram-lhes que estão a aconselhar os pais a não deitarem o lixo em qualquer lugar, mas sim nos caixotes designados para o efeito. Também deixaram de queimar plástico e PVC porque agora compreendem os riscos para a saúde.

"Gosto muito de conduzir sessões sobre a ação climática e a preservação do ambiente com as crianças", diz Jeanne. "Educamo-las sobre a questão das alterações climáticas e o seu impacto. Também lhes dizemos que é um problema muito sério a nível global e o que podem fazer para mitigar os seus efeitos."

Jeanne Muhimundu (ao centro) a caminho com os seus colegas refugiados para limpar áreas do campo de refugiados de Tongogara, no Zimbabué, no âmbito das atividades de limpeza regulares organizadas todas as primeiras sextas-feiras do mês

Jeanne Muhimundu (ao centro) a caminho com os seus colegas refugiados para limpar áreas do campo de refugiados de Tongogara, no Zimbabué, no âmbito das atividades de limpeza regulares organizadas todas as primeiras sextas-feiras do mês. © UNHCR/Hélène Caux

Os jovens ativistas do clima imaginam um campo livre de todos os materiais não biodegradáveis, cheio de árvores e com sistemas de gestão de resíduos adequados. Entretanto, têm uma mensagem para os líderes mundiais que participam na conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas - COP28, que teve início no Dubai na semana passada.

"É tempo de eles, de nós, assumirmos a responsabilidade pelas nossas ações enquanto raça humana", diz Elie. "Alguns dos danos causados à Terra são irreversíveis. Mas a minha esperança é que atuemos a tempo de travar as alterações climáticas ou reduzir os seus efeitos, e apoiar e proteger a próxima geração. Não acredito que a Terra já esteja perdida".

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